Seria estranho escrever menos sobre o show do Radiohead do que escrevi sobre os shows do Kraftwerk e do Los Hermanos. Mas a verdade é que não dá para dizer nada sem parecer piegas. Não sobre um show do Radiohead.
Talvez, para fugir disso, eu devesse falar sobre a tragédia que foi a organização do festival. Sobre a dificuldade de se chegar na Chácara do Jockey. Sobre a minúscula ladeira na qual 30 mil pessoas se espremeram para deixar o lugar, no final da apresentação. Sobre a impossibilidade de se encontrar um taxi disposto a te levar embora. Sobre o cheiro de excrementos de cavalo. Sobre os diversos "brejos" formados pelos mesmos excrementos no gramado do show e, por fim, sobre copos de água vendidos a cinco reais.
Mas a verdade é que, no palco, em pouco mais de 130 minutos, o Radiohead chegou à perfeição. E a todo momento, no show, eu me lembrava de uma coluna do Álvaro Pereira Junior onde ele falava sobre “como é um show do Radiohead”. De como ele dizia que os discos "difíceis" da banda, no palco, passavam a fazer sentido. “Não representavam a ruptura que, em um primeiro momento, se imaginava (ou que pelo menos eu imaginei)”, escreveu ele. No último domingo, era exatamente disso que eu me lembrava. De como as músicas, de diferentes fases e álbuns da banda, de uma hora para outra se pareciam absolutamente coerentes entre si. A diferença é que, ao falar de um show dessa mesma turnê, em Toronto, no ano passado, ele dizia que “a banda estava gelada. Perfeita e sem vibração.” E ia além: “(...) tenha em mente: o show, que dura duas horas, não é arrebatador. É, isso sim, milimetricamente profissional.”
Sobre o show não ser arrebatador, eu não consigo discorrer – talvez por ser meu primeiro show do Radiohead (e até por culpa da minha pouca experiência com apresentações desse “porte”) eu fui absoluta e completamente arrebatado. Abduzido, até. Esse tipo de análise mais “distante” é coisa para gente como o Álvaro; coisa de gênio. Mas sobre uma coisa eu posso, certamente, discordar dele: dessa vez, a banda estava perfeita e, completamente, vibrante. Vibrante e alegre a ponto de se fazer estranhar por aqueles que (como eu) esperavam dar de cara com os cinco caras mais tristes e enigmáticos da música pop.
Assim, depois de alguns dias imaginando uma forma para descrever essa experiência, decidi que o melhor é desistir. Em seu lugar, vou tentar me prender a fatos que me marcaram na primeira passagem do “expresso da angústia” – expressão que roubei do portal Estadão - pelo Brasil. Eu poderia listar dezenas deles, centenas até; mas vou ficar em apenas oito:¬ Foi uma surpresa ver, na primeira página do site Ego, o Thom Yorke pagando de garoto de Ipanema e levando suas pelancas para curtir a praia no Rio de Janeiro, no primeiro dia da banda no Brasil. Faço minhas as palavras da Ana Bean: “Eu nunca imaginei que o Thom Yorke tivesse uma bermuda. Muito menos que ele fosse à praia. Que ele pegasse jacaré então...”
¬ No dia seguinte ao show do Rio de Janeiro, Bruno Medina, tecladista do Los Hermanos, escreveu em seu blog que “foi um pouco sui generis testemunhar Thom Yorke requebrando as cadeiras enquanto tocávamos Morena na passagem de som”. Hã?
¬ Entre um ápice e outro do show em São Paulo, eram tensos os silêncios que hipnotizavam a plateia durante alguns momentos. Como descreveu bem a Ana Bean (de novo ela!) na Popload: “quando Thom Yorke ensaiou a primeira frase de Exit Music (For a Film), ninguém se mexeu ou resolveu cantar junto. Não tem como não se arrepiar com 30 mil pessoas… em silêncio.”
¬ Dava até para imaginar que alguma coisa estava errada quando algumas frases em português “invadiam” o show. Mas, em entrevista - a única dada em terras brasileiras - ao Edgard, do Multishow, o Thom Yorke explica que esse é um “hábito” da banda.
¬ A última música que eu imaginei ouvir ao vivo foi You And Whose Army, minha favorita de Amnesiac e uma das minhas preferidas da banda. Descobri, no set list divulgado pelo Multishow, que ela entrou na última hora. Sorte minha. O Thom Yorke tocando piano com raiva e brincando de aproximar o olho da câmera está entre os meus melhores momentos do show.
¬ O que foi o povo continuar cantando “come on rain down on me” depois que Paranoid Android terminou? E a banda lá, sem entender nada, com um olhando para a cara do outro e sorrindo como quem diz: “whatafuck?!”
¬ E teve Fake Plastic Trees. E nessas horas a gente parece bobo e jura que eles cantaram a música para nós – para mim, no caso. Uma pequena história: ouvi o nome do Radiohead pela primeira vez na coluna do Álvaro (sempre ele!). Mas só quando ele citou que eles estavam tocando até em comercial na tv foi que eu pesquisei e descobri que se tratava da minha propaganda favorita de todos os tempos: a do Carlinhos no carrossel. Foi assim, arrebatador. Um caminho sem volta. E agora aquela música ali, domingo, fazendo a minha espinha gelar.
¬ Por fim, tem aquelas coisas que o palco fez. Quando a gente vê notícias de crianças japonesas tendo ataques e morrendo na frente da tv, hipnotizadas pelos efeitos visuais de alguns desenhos animados, deve ser assim que acontece. Mas ali, no show do Radiohead, foi como uma moldura para o som. Para ficar em apenas um momento: o que foram os efeitos de luz em Creep? Como se já não bastassem os versos daquele refrão, os “golpes” de luz branca com listras coloridas eram de derrubar qualquer um. Fantástico, para dizer o mínimo.
Tem muita coisa, ainda; mas eu juro que teria que ficar aqui para sempre.
(A primeira foto é do Daigo Oliva - G1 - e a segunda do Flavio Florido - Uol)
Nenhum comentário:
Postar um comentário