“A Visita Cruel do Tempo” é o melhor livro que o Nick Hornby não escreveu. E tem o enredo mais difícil de ser definido desde a última série do Luiz Fernando Carvalho. Gosto da explicação da editora brasileira para o “duro desafio linguístico” de transpor o intraduzível título original para o português: a solução foi encontrar um título que interpretasse “os efeitos do impiedoso personagem central da trama, o tempo”.
É provável que o título nacional seja melhor que qualquer outro título dado ao livro em qualquer lugar do mundo. E que sozinho ele diga mais sobre o seu enredo que qualquer resenha acadêmica de jornal.
Em “Irreversível”, melhor exemplo de cinema francês possível, Gaspar Noé repetia que o tempo destrói tudo. E é também sobre isso que trata o livro da Jennifer Egan. Há uma passagem na história, em especial, que esbugalha esse sentimento. Na edição brasileira o trecho vem destacado já na folha de rosto do livro:
Ouvindo sobre as inspirações da autora para a história (Marcel Proust, "Família Soprano", "Pulp Fiction") fica fácil concluir como qualquer coisa que fosse resultado disso, somada à forma como essa mulher consegue elaborar um texto, não poderia resultar em algo menos que formidável.
A questão é que tudo o que importa sobre o livro já foi dito. E eu só vim até aqui para falar que revendo "Pulp Fiction" ontem (e concluindo que ele é muito melhor do que eu poderia supor há 17 anos), uma das minhas cenas favoritas do filme me chamou especial atenção: quando o mafioso Marsellus está tentando convencer o boxeador Butch (Bruce Willis) a aceitar a proposta de perder uma luta. Em um bar vazio, Marsellus fala para Butch:
"O negócio, Butch, é que neste momento você tem habilidades.
Mas, por mais doloroso que seja, a habilidade não dura.
E seus dias estão se acabando.
E seus dias estão se acabando.
É a difícil realidade dessa merda.
Mas é uma realidade que você terá que aceitar.
Mas é uma realidade que você terá que aceitar.
Esse negócio está saturado de irrealistas filhos da puta.
Filhos da puta que pensavam que envelheceriam como o vinho.
Se pensar em termos de vinagre... até acontece.
Se acha que fica melhor com a idade... não acontece."
É como se Marsellus tivesse lido “A Visita Cruel do Tempo” antes mesmo de sua concepção.
O tempo é cruel, não é? O tempo destrói tudo. Quentin Tarantino, Jennifer Egan, Gaspar Noé, eu, você e os 500 milhões de amigos do Mark Zuckerberg sabemos disso. Mas não custa repetir.
[A primeira imagem foi copiada de uma postagem no site da editora Intrínseca]
Um comentário:
Eu concordo q o tempo é o personagem principal, mas acho que o título em português bo Brasil entregou isso. O título em inglês esconde isso.
Se eu não soubesse o nome no Brasil, poderia ler o livro sem ter isso em mente e talvez fosse uma experiência melhor, pelo menos seria diferente. Goon squad poderia ter sido traduzido como em portugal - brutamontes, ou ainda impiedosos...
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