sexta-feira, 14 de março de 2008

A islandesa e o gigante sanguinário

Pequim é a sede da Olimpíada de 2008, que acontece em agosto. Logo, com a aproximação dos jogos, é natural que a mídia de todo o mundo esteja com os olhos voltados para a capital chinesa.
Também é natural que uma campanha piegas propague os costumes e as histórias traduzidas do mandarim para o resto do planeta. O que atormenta é saber que não haverá espaço em programas de variedades ou jornais e revistas para algum tipo de informação acerca da natureza ditatorial do regime chinês. Nem sobre os milhões de seres humanos que a mesma Pequim mantém em campos de trabalho.
Há algumas semanas o cineasta Steven Spielberg desistiu de dar assessoria a essa Olimpíada em protesto contra as políticas chinesas para o Sudão. O governo chinês garantiu que isso não atrapalhará o sucesso dos Jogos. Não mesmo.
Em artigo publicado na Folha de S. Paulo há algumas semanas, João Pereira Coutinho avaliou que, para Spielberg, o problema não está na repressão interna que a China promove sobre dissidentes políticos ou minorias religiosas. Ou na ocupação do Tibete. Nem nos milhares de homens que o regime executa anualmente por "delito de opinião". Apenas no Sudão.
“Uma coisa é matar chineses, desporto que manifestamente não impressionou Spielberg quando ele aceitou a honraria oficial de embelezar os jogos. Outra coisa, bem mais grave, é matar os habitantes de Darfur”, avaliou o colunista.
Não haveria problema algum no protesto do cineasta se ele fosse apenas parte de uma manifestação conjunta. Essa seria a sua bandeira, portanto. A história só pareceu estranha porque o único protesto contra os jogos, que realmente ganhou a mídia, se voltou para algo muito pequeno diante da grandeza do violento regime chinês.
Na semana passada, a cantora Björk encerrou um show em Xangai com uma homenagem ao Tibete. O gesto da artista islandesa ganhou uma notícia de rodapé no jornal O Globo. No fim do espetáculo, ela adicionou gritos de “Tibete! Tibete!” à música Declare Independence. A atitude irritou o governo chinês que decidiu investigar, a partir de agora, a vida de todos os artistas que estão programados para tocar no país.
A China invadiu o Tibete em 1951 alegando laços históricos com o território. Hoje ela reprime com violência e autoritarismo qualquer tentativa de obtenção de maior autonomia. Assim como a China, o resto do mundo conhece muito pouco a Björk. Spielberg também é insignificante perto do portentoso gigante asiático.
Coutinho lembrou que a história da maldade humana está bem representada na história dos Jogos Olímpicos. Em outros tempos, eventos como os de Berlim, Munique ou Moscou não serviram para nada se não para esconder a natureza sinistra dos regimes políticos de seus países sede, lembrou o cronista.
Em seu site, Björk disse que gostaria de desejar a todos os indivíduos e nações boa sorte na sua batalha pela independência. O resto do mundo vai desejar sorte para os milhares de atletas durante as suas batalhas travadas nas arenas milionárias construídas em Pequim.
O sangue só vai ser derramado do lado de fora.

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