Poucas sensações são tão especias quanto a de se sentir embasbacado ao terminar um livro ou sair do cinema - no final do filme. Essa semana eu me senti assim duas vezes. A primeira delas tem a ver com algo que já vinha dando voltas na minha cabeça havia bastante tempo: O Estranho Caso do Cachorro Morto.
Não me lembro da primeira vez em que ouvi falar desse livro. Lembro apenas de quando descobri seu autor, Mark Haddon. Foi na livraria de um shopping, quando eu garimpava algo de diferente na ilha de lançamentos. E então eu encontrei Uma Coisa de Nada, sua obra seguinte à do cachorro. Não comprei o livro e até hoje não o li inteiro. Mas fiquei impressionado com o texto; e com a história, com a capa.
No final das contas, eu só adiei a possibilidade daquela experiência – a experiência de ler Haddon.
A questão aqui é que o tal livro do cachorro foi aparecendo na minha frente diversas vezes desde então. E o mais importante de tudo é que o livro é mesmo incrível.
Eu poderia gastar muito tempo elogiando sua narrativa engenhosa. E dizer que ele conta a história de um menino autista que decide investigar o assassinato do cachorro da vizinha e acaba descobrindo muito mais do que gostaria. Acontece que o ponto é que eu me rendo à histórias que envolvam pessoas com algum tipo de deficiência mental. E foi principalmente isso que me arrebatou: Haddon parece conhecer a mente de um autista como se fosse um deles. E prova isso principalmente nas entrelinhas, nas coisas que não diz.
Há uma passagem no texto que me impressionou, em especial. É quando Christopher, o menino, ouve sua mãe brigando com o namorado e então decide pegar um rádio portátil na cozinha e se fechar no quarto com o aparelho sintonizado entre duas estações. A explicação dele para isso dispensa comentários: “para só poder escutar o barulho vazio, daí aumentava bastante o volume, e apertava o rádio no meu ouvido, e o chiado enchia meu ouvido e me doía tanto que eu não sentia mais nenhuma outra dor, como a dor no meu peito (...).”
Ainda tem a outra descoberta que eu fiz essa semana que, embora eu não soubesse antes de entrar no cinema, também tem a ver com o camarada Christopher. E com o novo Star Trek.
Minhas lembranças com Jornada nas Estrelas, de que o personagem do livro também é fã, remetem a quando a série era reprisada na TV, nos fins de tarde. E só. Lembro muito pouco das histórias. O que eu lembro mesmo é de nunca ter entendido, ao certo, se o Spock, o cara das orelhas pontudas, era um homem bom ou mau.
O que eu soube, a partir do momento em que descobri que a direção do novo filme da série ficara por conta do J. J. Abrams, foi que certamente eu iria ao cinema vê-lo. E pronto; eu fui.
Daria para ficar aqui listando as marcas do diretor no filme. Na trilha, nas reviravoltas do roteiro, nas cenas que não te deixam respirar. Está tudo ali, inclusive a neura por viagens no tempo que fazem com que um personagem encontre consigo mesmo em outra época e os incríveis flashbacks de sempre.
Mas a coisa toda vai muito além disso. Muito mesmo. Star Trek é o melhor filme que eu vejo em muito tempo. Depois de tanto dinheiro desperdiçado tentando encontrar algo que fosse além do trivial no cinema, esse valeu cada centavo gasto. Só a sequência inicial, se repetida durante duas horas, já valeria, sozinha, o ingresso. Mas há muito mais.
A verdade é que não há nada como boas histórias contadas de maneira brilhante para fazerem você acreditar nessa estranha força, descrita pelo narrador no final do filme, que nos leva a descobrir novos mundos. Seja na tela grande ou nas páginas de um livro, uma força que tem a ver com uma espécie de recompensa impossível de ser descrita.
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